domingo, 25 de agosto de 2013

EU SOU CARTOLA, EU SOU A ESTAÇÃO PRIMEIRA!*


     Angenor de Oliveira descobriu que era Angenor, quando casou com Zica, já quase sessentão. Até ali se julgava Agenor, como era chamado pelo pai, Sebastião Joaquim de Oliveira, e pela mãe, Ana Gomes de Oliveira. Mas, o erro do escrivão não teve importância, pois a cultura brasileira consagraria o compositor da Escola de Samba Primeira de Mangueira pelo singelo apelido de Cartola.

     Cartola nasceu no Rio de Janeiro, em 11 de outubro de 1908, e teve infância de menino bem tratado pelos pais e avós. Participava de festas de rua, frequentava o Rancho Arrepiado e gostava das festas de ruas de Laranjeiras, o seu bairro. Desfilava no dia de Reis e só não gostava das várias escolas pelas quais passou, concluindo o curso primário a muito custo.
     A família se muda para o morro da Mangueira e o destino do moleque Agenor (então com 11 anos) estaca selado. No morro, mistura-se com a malandragem, começa a se interessar pela música e entra em conflito com o pai. Pouco tempo depois, a mãe morre, o pai abandona a Mangueira, mas Cartola, à época com 14 anos, fica por lá, iniciando carreira de boêmio.
     Entre uma roda de samba e outra, tratou de arrumar emprego. Perambulando por algumas gráficas, mas acabou ajudante de pedreiro e mais uma vez o destino interferiu: usando chapéu-coco para não sujar os cabelos com cimento, passou a ser chamado de Cartola pelos companheiros e nunca mais outro nome o identificou.
     Em 1928 já estava tomado pelo amor à Mangueira. Os amigos, bambas nas pernadas das rodas de samba, respeitavam a facilidade com que tratava o violão e a inspiração que fazia nascer sambas já famosos em toso o morro. Quando fundaram o Bloco dos Arengueiros, levaram o menino franzino, que não ajudava em briga, mas na hora de fazer samba era imbatível.
     Pois foi o menino que percebeu que era hora de acabar com arruaças, unificar os sambistas e criar uma Escola de Samba que representasse o morro e fosse respeitada. Foi dele a escola do nome Estação Primeira de Mangueira. foi ele quem selecionou as cores verde e rosa para o pavilhão que seria o mais amado do Brasil. Cores conflitantes, mas que harmonizam perfeitamente quando se unem em nome da Mangueira.
     O primeiro Diretor de Harmonia da Mangueira foi Cartola. Seus sambas-enredo criaram escola ("Vale do São Francisco" é citado ainda hoje como um dos melhores de todos os tempos), logo a fama desceu as ladeiras e espraiou-se pela cidade. Cantores como Francisco Alves e Mário Reis paravam carros de luxo no pé do morro a procura de Cartola, para comprar seus sambas. Carmem Miranda e Sílvio Caldas, entre outros astros e estrelas do rádio, gravaram sambas "daquele talentoso menino da Mangueira".
    Nessa fase, Cartola fica viúvo, some e chega a ser dado como morto. Redescoberto no final dos anos 1950, volta à Mangueira, casa-se com Zia, abre o restaurante Zicartola e retoma a história do samba, interrompida desde que estava desaparecido. Em 1974, com produção de J.C. Botezelli, o Pelão, graça o primeiro LP (viriam outros), documento importante para a cultura brasileira.
     Vive então uma fase áurea de reconhecimento à sua arte, mas, em 30/11/1980, morre aos 72 anos. Velado na quadra da sua Mangueira, foi enterrado no Cemitério do Caju.


* Texto extraído da Coleção História do Samba, Vol. Galeria do Samba, p.10.

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